Em artigo levado às páginas da Folha, questiona a própria existência de tais colegiados. Chama-os de tribunais “de exceção”.
No miolo do texto, Sarney sustenta a tese de que a falta de decoro deve ser julgada por ministros do STF, não pelo Congresso.
Não faz referências diretas ao seu ex-drama. Mas, indiretamente, expõe as artimanhas que o livraram da grelha.
Anota que os "juízes" do Conselho de (a)Ética, assim, entre aspas, são parlamentares “escolhidos pela composição dos partidos políticos”.
Por isso, escreve Sarney, o conselho torna-se “um organismo julgador, sem as isenções de um juiz”.
Foi precisamente o que se deu no seu caso. Renan Calheiros, chefe da milícia congressual de Sarney, brindou o amigo com um tribunal de fancaria.
A começar pelo presidente, o suplente de suplente Paulo Duque (PMDB-RJ), convertido em engavetador-mor. A pergunta é:
Se Sarney acha que o “tribunal” deve ser isento, por que permitiu que Renan indicasse gente como Wellington Salgado, Almeida Lima e Gilvan Borges?
Ou por outra: Por que exigiu de Lula a domesticação dos petês com assento no colegiado?
Sarney queria ser julgado segundo as regras da empulhação, eis a resposta.
No artigo, o senador joga para a reforma política a aprovação de regra que transfira para o STF os julgamentos por quebra de decoro parlamentar.
Cabe mais um par de perguntas: Por que não modificar imediatamente a forma de compor o conselho, livrando-o da proporcionalidade das bancadas?
O que fazer com as denúncias que pipocam em ritmo diário, antes que chegue a reforma política que ninguém quer fazer?
Nesta sexta (21), a propósito, a mesma Folha que traz o artigo de Sarney veicula nova denúncia contra o senador.
A notícia vincula Sarney, de novo, à edição dos famigerados atos administrativos secretos. O que fazer? Decerto a platéia deve aguardar pela reforma política.
Aos que se dispõem a engolir e digerir, vai abaixo a a íntegra do artigo de José Sarney:
Um passo necessário
"Nos últimos debates sobre a crise no Senado, questionou-se a existência e o funcionamento de um Conselho de Ética que tem a atribuição de julgar os parlamentares pelos próprios parlamentares.
O senador José Agripino levantou a tese, e ela é relevante. Tem aflorado algumas vezes, e muitos são os que dela discordam, como o próprio líder do DEM.
A criação do Conselho de Ética é invenção recente, que não fazia parte de nossas casas parlamentares. Foi criado no Senado em 1993, pela resolução nº 20, e na Câmara dos Deputados em 2001, pela resolução nº 25. Não é uma norma de nosso direito constitucional.
A nossa Constituição diz apenas que, quando 'o procedimento for declarado incompatível com o decoro parlamentar', perderá o mandato (artigo 55, parágrafo 2º) pelo voto secreto da maioria absoluta.
Os conselhos de ética incorporaram procedimentos legais usados em órgão de processo penal e têm tudo de uma corte de instrução e julgamento.
Ora, os 'juízes' são os próprios parlamentares, por sua vez escolhidos pela composição dos partidos políticos, tornando-se assim um organismo julgador, sem as isenções de um juiz.
Muitas vezes, os membros do Conselho de Ética se sentem desconfortáveis tendo de julgar os seus próprios colegas, numa violência à consciência ou às normas jurídicas. Transforma-se num tribunal partidário, em que cada partido tem que usar a norma de 'ação versus reação'.
Tal procedimento é de uma democracia atrasada, em que o mandato popular fica sujeito ao humor e idiossincrasia do embate político. Ninguém se comporta como um juiz e ninguém é juiz.
Cada um é um representante partidário que deseja a vitória do seu partido e não raras vezes quer a cabeça de um adversário. O resto a mídia se encarrega de fazer, também tomando partido e exigindo o voto, ameaçando da execração pública quem não se comportar de acordo com suas vontades e opiniões.
A nossa Constituição, no artigo 52, inciso II, diz ser 'competência privativa do Senado Federal [...] processar e julgar os ministros do Supremo Tribunal Federal'. Já ao STF compete (artigo 102) 'processar e julgar originariamente [...] os membros do Congresso Nacional'.
Ao Senado compete julgar os membros do Supremo, e a este, os membros do Senado. Nada mais justo, democrático e de respeito à soberania popular que o mandatário do povo, eleito pelo voto, tenha direito a um julgamento isento.
Assim, na reforma política, deve ser estabelecida a extensão desta norma, de membros de um Poder julgarem os do outro, que leva a se fazer sempre justiça, e não como hoje um tribunal político, um tribunal de exceção, um tribunal político partidário, como são os conselhos de ética". Blog do Josias de Souza
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