Por José Reinaldo Tavares - ex-governador do Maranhão
Intriga todo mundo a força que Sarney mostra possuir junto a Lula. Em uma democracia, é impensável um governante colar sua imagem a alguém muito enrolado e tão desgastado com a totalidade da opinião pública como Sarney.
O Datafolha publicou pesquisa mostrando que quase 80% da população brasileira queriam que Sarney fosse apeado da presidência do Senado, mas nem assim o presidente da República retirou o apoio cada vez mais explícito e ostensivo que dá a ele.
Isso não cabe no padrão Lula de tratamento a auxiliares ou amigos metidos em confusão. Pelo menos, não foi assim com seus velhos companheiros que ocupavam cargos de grande importância no seu governo... Nem José Dirceu, tampouco Palocci e outros que não tiveram apoio na desgraça. Isso sem contar que Sarney ultrapassou, em muito, a todos eles em matéria de indícios de corrupção, falta de ética e toda sorte de malefícios.
Pois bem, alguma coisa deve ter acontecido durante o longo calvário de presidente do Senado. Sim, porque Lula ensaiou a retirada e comentou publicamente que Sarney não era problema dele, era do Senado. E até chegou a dizer que nem tinha votado nele para a presidência daquela Casa. Naquele momento, Sarney sentiu que a terra estava começando a faltar sob seus pés. Era o velho padrão Lula de dizer “não é comigo”. Entretanto, logo em seguida, Lula mudou. O que teria acontecido para Lula mudar de rumo?
César Maia, atento observador da política nacional, chega à conclusão de que, na verdade, Lula quer do PMDB apenas o tempo de TV do partido, já que não dá para resolver a grande confusão nos estados entre tal partido e o PT. Isto posto, não é definitivamente o apoio nacional do PMDB que se almeja. Maia escreve assim em seu blog:
“Do ponto de vista político, a atratividade do PMDB para 2010 não é tão significativa. Para qualquer conclusão, há que se avaliar a eleição mais sinérgica com a presidencial, que é de governador. Por outro lado, toda a coreografia ocorrida no Senado nos últimos meses gera um desconforto dentro do próprio PMDB. Faz lembrar Groucho Marx: ‘Entrar para esse clube? Eu? Não! Eu não entraria para um clube que me aceitasse como sócio’.
Resta, portanto, um raciocínio apenas. O que Lula quer do PMDB é o tempo de TV. Tática, aliás, que fazia muito mais sentido numa eleição plebiscitária onde Lula pudesse vir liderando a Comissão de Frente. Os atritos federativos serão de tal ordem que - se tivesse volta atrás, depois dos fatos do Senado - o melhor teria sido combinar com o PMDB para lançar à vontade seus governadores como outro palanque de Dilma/Lula, desde que não tenha candidato a presidente, para, no mesmo raciocínio, não dar o tempo de TV para ninguém”.
Pela análise de Maia, para isso Lula não precisaria se desgastar com Sarney que, entre outras coisas, não controla o partido.
O que mais poderia ser então? Vamos ver o que disse Reinaldo Azevedo da Veja:
“A crise no PT não é irrelevante. Provocada pela adesão do partido à causa de José Sarney. Acho que estamos todos – refiro-me aos que escrevemos sobre política – mais ou menos equivocados sobre os motivos. O que é que se toma como dado na equação? Temeroso de prejudicar a candidatura de Dilma Rousseff, que precisa do apoio do PMDB, Lula decidiu emprestar solidariedade incondicional ao presidente do Senado porque considera que sua renúncia ou destituição da presidência da Casa prejudicaria o seu governo.
Será mesmo? Por quê? Quem é capaz de apontar os prejuízos efetivos? Como todos sabem, é uma falácia afirmar que o tucano Marconi Perillo (GO), vice-presidente, passaria a presidir o Senado. Seria assim por algum tempo. Outra eleição teria de ser feita. O governo tem a maioria necessária para fazer o novo presidente. Por que esse apoio obstinado?
Depois de analisar o seu procedimento com outros companheiros enrolados, escreve:
“Para o PT, Sarney é um daqueles casos em que a soma resulta menor do que o original – o sinal do homem é mesmo negativo”. E continua:
“O que não conseguimos dizer até agora – nenhum de nós chegou lá – é por que Lula vive a sua mais persistente fidelidade. Até Marisa Letícia deve estar dizendo: ‘Gente, ele nunca foi assim’. O segredo, estou certo, está naquela reunião quase secreta de José Sarney com Dilma Rousseff, enquanto Lula trocava abraços-e-beijinhos-e-carinhos-sem-ter-fim com o assassino em massa Muammar Kadafi, na Líbia – naquele dia, num amarelo deslumbrante, Lula chamou o homicida de ‘amigo e irmão’ – convenham: abraçar Sarney, perto disso, é pinto de bigode”…
E finaliza:
“Caso Lula tivesse decidido (se pudesse) livrar-se de Sarney, vocês acham mesmo que os patriotas do PMDB romperiam com o governo para seguir um líder decrépito rumo, na melhor das hipóteses, ao oblívio? (…) Lula dorme lendo livros do Chico Buarque, mas não dorme com olhos alheios. Sempre foi um grande calculista. Ele está vendo o preço a pagar por manter o apoio a Sarney – e não é pequeno –, mas certamente sabe que o outro seria maior. E nada tem a ver com a disputa eleitoral de Dilma Rousseff. Ou alguém acha que essa lambança toda com Sarney colabora com a candidatura Dilma?
Lula não fechou com Sarney para se proteger da oposição. Lula fechou com Sarney para se proteger de Sarney!”, conclui.
É preciso recordar que a CPI da Petrobras estava com as assinaturas necessárias, mas Sarney não permitia ler o requerimento. Sarney viu que ali estava uma mina de ouro e Renan Calheiros, a partir de então, enfrentou o PT e o governo e colocou a turma dele para ter o controle da CPI.
Para instalá-la, ele se valeu do vice-presidente do Senado, senador Marconi Perillo do PSDB. Numa sexta-feira morta, Sarney mandou buscar Marconi e, com o plenário vazio, fez com que este lesse o requerimento, tornando irreversível a CPI. Foi ele – Sarney – que tornou realidade a comissão, ação estranhíssima para um aliado. A partir daí, ele tinha como manipular o presidente da República e o governo em si. Estava salvo.
Explica-se assim a forma desabrida e confiante com que enfrentou a opinião pública. Claro, ele sabia que teria força para ficar na cadeira.
Este é o Sarney. Um estadista…
O ex-governador do Maranhão - José Reinaldo Tavares escreve para o Jornal Pequeno às terças-feiras.
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